domingo, 22 de novembro de 2009

O amor de todos os dias




Quinta-feira de um dia de muito calor. Fui escalado para uma reunião no trabalho de última hora. Liguei para a minha esposa informando-a e dizendo que não me esperasse para o jantar. Estarei te esperando, foi a sua resposta. Como sempre a reunião fora uma chatice sem tamanho e eu estava morto de vontade de voltar para casa. Colocados todos os assuntos em pauta, finalizou-se a reunião e um instante depois eu já estava posicionado no banco do motorista, o carro ligado, indo rumo ao meu porto seguro.


Estacionei o carro na vaga 306. Pintaram a garagem? Não tinha reparado. A verdade é que eu era um homem muito ocupado, trabalhando numa empresa de publicidade. Nunca tinha tempo para passeios, festas, happy hours. Sempre estive focado no trabalho e eu o considerava a minha vida. Casei-me há alguns anos e achei que não duraria um mês. Acho que alguma coisa em mim havia mudado.


Entrei em casa, pé ante pé, para não acordar a minha companheira. A mulher da minha vida, pensei não segurando um meio-sorriso de contentação. Atravessei a sala, abri a porta do quarto lentamente e a encontrei dormindo de lado, lençol desenhando sua silhueta que eu tanto desejava. Sentei-me na poltrona e observei-a dormir. Tinha a respiração leve. Depois de tanto tempo eu ainda suspirava por ela.


Levantei-me,acendi um cigarro e fui para a sacada do quarto. Eu havia lhe prometido parar de fumar, mas sempre o fazia escondido as vezes. Era um hábito que eu alimentava desde os 18 anos. Não poderia me livrar dele facilmente depois de 18 anos.


Pensei na minha idade, nos planos de minha juventude. Pensei nas coisas que eu queria fazer e não fiz, e nas coisas que nunca pensei em fazer e fiz. Ser publicitário era mais que uma profissão, era um hobby. É lógico que algumas vezes isso me cansava em demasia e eu sempre me queixava de estresse. Ainda assim era tanto a minha fonte de renda, quanto minha paixão.


Minha segunda paixão era, sem dúvidas, a minha esposa. Cabelos negros, olhos grandes e uma boca que parecia estar sempre sorrindo. Eu a conheci na faculdade. Uma daquelas beldades universitárias, com jeito de miss e comportamento de menina. Lembro-me que passei 1 ano inteiro apaixonado por ela à distância, mas não me lembro bem como tive coragem de me aproximar dela e, para o meu grande espanto, ouvir um sim, podemos ir ao show dos Istôunes. Ela era simplesmente demais! De lá para cá não nos desgrudamos.


Como todo casal que se preza, nós temos nossas pequenas discussões. Nada que afete nossa boa convivência. Ela tem um jeito de não deixar as coisas desandarem e isso me deixa extremamente tranqüilo: meu trabalho sempre me esgota.


Ainda debruçado na janela, observando um semáforo que insistia em picar na luz amarela, lembrei do pedido de casamento. Como será morar num apartamento com vista para o Parque Central? Eu não sabia a resposta. Resolvemos descobrir juntos. Resolvemos isso há 12 anos atrás.


Dei uma espiada por cima do ombro. Ela ainda dormia seu sono invejavelmente profundo. Virei-me para frente, dei umas últimas tragadas no cigarro, fechei a janela, entrei no banheiro. Olhei no relógio. Quase 0:30h. Logo, logo eu teria que levantar e enfrentar o trânsito, a correria do dia a dia, a agonia para voltar logo para casa.

Com cuidado me deitei ao lado dela. Num instante ela já tinha o rosto aninhando em meu peito. Toquei de leve sua barriga. Uma nova vida. Nossa vida. Murmurou algumas palavras que eu entendi como sendo "que bom que você chegou". Sorri. Era realmente bom estar ali.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

A Pequena da Ilha

Conheci uma pequena, uma vez, dessas que fazem o coração de qualquer homem experiente parar.

Ela veio em minha direção de pés descalços e trazia uma flor na mão.

Seu cabelo ao vento, cor de ouro, dava-lhe a feição de uma deusa, dessas que a gente não sabe nomear.

Não me lembro seu nome; não sei se era Marina ou Pilar, só sei que tinha flechas nos olhos e um sorriso de raios de sol.

Contava-me coisas de seu povoado ou simplesmente descansava seu rosto em meu peito ofegante.

Tinha mãos delicadas, como de veludo e pura seda. Afagava meus cabelos com a leveza de uma pluma e ninava meu sono quando eu voltava do mar.

Essa menina queria ser minha e era isso o que eu era para ela: o seu dono.

E eu, marinheiro de várias viagens, decidi ancorar em seu cais, guiado pela luz de seus olhos e a tepidez de sua cintura.


***

Conheci uma pequena, uma vez. Uma última vez. Seu cabelo de fogo ainda permanece cravado em meu coração como um espinho que não sai.

Seu riso de malícia desapareceu de meus dias, agora com pouca luz.

A menina que me fez tatuar seu nome em meu peito.

Ela se foi.

Não deixou rastros, só lembranças.

Onde andará, não sei. Mas ainda sinto seus passos flutuantes em minha vida cansada de procurá-la novamente.

Em meus sonhos já não existe mais esperança e minh’alma chora sua ausência.

A menina sem nome, a minha menina sem ser.

Até a próxima, minha.

Descanse em paz.



segunda-feira, 9 de novembro de 2009

A chuva e o meu amor



As gotas de chuva começavam a demonstrar seriedade. Inerte, eu não conseguia me mexer. Parado ali naquele banco de praça eu não suportava a ideia de tanta espera. Fazia tanto tempo que eu estava ali, imóvel, esperando que ela se aproximasse e me fizesse feliz, mas ela não chegava. Não entendia o porquê da demora e nem sabia ao certo se havia qualquer motivo. A realidade é que eu corri muito para esperá-la.

A água insistia em cair mais forte e eu já não sentia as lágrimas escorrerem por meu rosto. De cabeça baixa, derrotado, me vi no meu ponto mais fraco. Desisti de lutar, me fartei de tanta queda, mas no fundo eu ainda a queria. Lutei tanto para tê-la, desejei tanto seu rosto perfeito para mim.

Comecei então a duvidar dessa coisa de destino. As pessoas viviam dizendo que temos que merecer para ter algo. Minha cabeça ficava mais confusa com essas declarações. O que eu fazia que a afastava? Quanto mais eu esperava por ela, mais ela demorava a chegar. Pensando nisso, não pude evitar os soluços. Lavei meu corpo e minha alma naquele banco de praça.

As pessoas passavam e me olhavam. Traziam estampadas nos seus rostos a certeza da minha loucura. Eu não estava louco! Não muito. Eu só queria o meu amor. Esperei por anos a vida de paz e felicidade que vendem na TV. Combati muitos demônios, atravessei vales com pouca luz, naveguei em mares agitados; tudo isso me fazia crer estar preparada para encontrá-la.

Afastei esses pensamentos. Com uma sincronia interessante, levantei-me no exato momento em que a chuva cessou. Eu não trazia guarda-chuva e estava ensopado. Olhei para o céu e vi umas rajadas de azul começando a despontar. Ri. Naquele instante tive a certeza do quanto fui bobo esperando. Ri mais e mais, e mais alto. E girei, saltitando, feliz com a minha certeza: eu era um tolo!

Mais uma vez as pessoas não compreendiam meus gestos e mais uma vez me chamavam de doido. E eu ria delas. Ria das ruas cinzentas. Ria do sol sobre a minha cabeça. Minha vida começou a fazer sentido para mim e eu me sentia eufórico. E corri. Corri pelos jardins da minha liberdade e pelos bosques de paz que agora eram o meu próprio ser. Sentia-me criança. Sentia-me sereno. Sentia-me como eu mesmo.

Sem perceber, segurei meu olhar no dela. Não sabia como era possível, mas eu a reconheci. Fiquei parado, mas dessa vez de pé. Ela riu. Riu de mim e para mim. Um riso que não vi logo, mas que eu sabia que só podia ser dela. Estendeu-me as mãos. Com olhos traquinas me ajudou a caminhar. Eu ainda sentir um torpor percorrer todo o meu corpo, mas ela estava ao meu lado. Eu quase não acreditei.

E ela pintou os meus dias com as cores do seu sorriso e a serenidade dos seus olhos-esmeralda. Ela coloriu minha vida e me convidou a caminhar com ela por entre as ruas dos sentimentos bons. Ela não é um passado. Ela não é um sonho.


sexta-feira, 6 de novembro de 2009

À Deriva




Histórias de naufrágios, conquistas e derrotas. Livros de descobertas e barcos em alto-mar. As âncoras sobre bancos de areia, a terra firme. O mar em meu peito.

Com isso, meus caros, dou-lhes as boas vindas. Sejam bem vindos a compartilhar meu riso e meu pranto, meus dias e minhas noites, minha imensidão e meu vazio.

Nos dias a seguir, hão de ser revelados ideias, segredos, paixões ou simples fatos do cotidiano. Por onde começar? Todos têm medo dos começos, mas segure firme sua bússola na mão e deixe que o saveiro veleje pelos mares dos sonhos.

O mar e sua imensidão. E eu, pobre navegante, limito-me a descrever-lhes minhas pequenas notas tiradas dos balanços do meu barco. Levo comigo minha pequena, minha pérola.

Nossas inspirações, além do amor pelo mar, são refletidas nas estrelas e na lua em sua plenitude. Juntos, gostaríamos de convidar-vos a caminhar conosco nossa jornada, refletir a luz de nossa paz, flutuar sobre nossas águas.